Olá Pessoal, aqui é o prof. Rafael Bravo, editor do Site, Defensor Público e orientador no meu projeto Estudos Dirigidos para concursos das carreiras jurídicas (MP, Magistratura, Defensoria, dentre outros) no curso Saber Jurídico (www.cursosaberjuridico.com.br).
Hoje trago para vocês um
recentíssimo julgado do STJ que vai despencar em provas, sobretudo em provas de
Defensoria, pois essa decisão é muito importante para a instituição. Inclusive,
houve sustentação oral da DPE/SP. E, aliás, é um tema fortíssimo para a DPE/RJ
que vem aí, hein pessoal?! Então fiquem ligados!
A 6º Turma do STJ decidiu por
unanimidade no HC 598.051/SP que a prova da legalidade e da voluntariedade
do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de
dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que
autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas
do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e
preservada a prova enquanto durar o processo.
O principal fundamento da decisão
é que o art. 5º, XI, da CRFB consagra o direito fundamental à inviolabilidade
do domicílio ("a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante
delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por
determinação judicial").
Nesse sentido, a inviolabilidade
do domicílio é uma das expressões do direito à intimidade do indivíduo, o qual
possui a legítima expectativa de ter o seu espaço íntimo preservado contra
devassas indiscriminadas e arbitrárias, perpetradas sem os cuidados e os
limites que a excepcionalidade da ressalva a tal franquia constitucional exige.
Inclusive, conforme citado por um
dos ministros em seu voto, certa vez, em discurso no Parlamento britânico, Lord
Chatan afirmou que: “O homem mais pobre desafia em sua casa todas as forças da
Coroa. Sua cabana pode ser muito frágil, seu teto pode tremer, o vento pode
soprar entre as portas mal ajustadas, a tormenta pode nela penetrar, mas o rei
da Inglaterra não pode nela entrar”. Essa célebre frase diz respeito ao direito
fundamental da inviolabilidade de domicílio, oponível frente ao Estado, que não
pode arbitrariamente desrespeitá-lo.
Por isso, o STJ entendeu que na
hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard
probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a
existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e
devidamente justificadas – ou seja, as razões não podem ser genéricas, nem
tampouco subjetivas -, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação
de flagrante delito.
Nesse sentido, mesmo o tráfico de
drogas, que é delito permanente, por si só não autoriza a entrada sem
mandado no domicílio em que supostamente se encontra a droga. Apenas será
permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso
decorrente da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e concretamente
inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada.
Ademais, o consentimento do
morador, apto a validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e
apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre
de qualquer tipo de constrangimento ou coação.
O problema, pessoal, é que
infelizmente na prática alguns agentes policiais entram em casas alheias
(sobretudo em comunidades) sem o consentimento do morador e em momento posterior
alegam que a entrada foi consentida.
Nesse sentido, o Ministro
Schietti considerou fundamental fixar limites da ação estatal, não para
favorecer o crime, mas para favorecer a cidadania, pois a entrada forçada em
domicílio sem justificativa prévia é arbitrária. Ora, não pode a constatação da
situação de flagrância posterior ao ingresso que justificar uma medida
inconstitucional e ilegal, de maneira que os agentes estatais devem mostrar
previamente que havia elementos mínimos a caracterizar fundadas razões para a
medida.
O ministro citou em seu voto
estudo que indica que 91% de prisões que envolvem tráfico de entorpecentes são
realizadas com a entrada de policiais em residências sem autorização judicial.
Logo, a validação do processo
de recolhimento de provas com ofensa ao direito a inviolabilidade de domicílio
e intimidade das pessoas pode comprometer a própria essência do Estado
Democrático de Direito. Ou seja, pessoal, o direito penal e o processo penal
não podem ser um campo em que “vale tudo” para se buscar a condenação de um
indivíduo.
Atenção: o STJ decidiu
que a prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso
na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser
feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar,
indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Além disso, a operação
deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada tal prova enquanto durar o
processo.
Caso essas condições não sejam
cumpridas, o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas
obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela
decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual
responsabilização penal do agente público que tenha realizado a diligência.
OBS: o STJ deu o prazo de 1 ano
para permitir o aparelhamento das polícias, treinamento e demais providências
necessárias para a adaptação às diretrizes da presente decisão, de modo a
evitar situações de ilicitude.
Agora, imagine que você está
fazendo uma prova de segunda fase de Defensoria e a peça prática narra um caso
concreto em que o ingresso policial na residência do assistido se deu sem o
cumprimento desses requisitos. O que fazer? Pessoal, sem dúvidas, alegar a
ilicitude e consequente nulidade das provas obtidas, bem como das dela
derivadas, nos termos do art. 157 do CPP. E a partir disso, Rafael, peço também
a nulidade da sentença? Não! Tendo em vista a nulidade das provas que ensejaram
a condenação, você deve pedir a absolvição do assistido!
Por último, mas não menos
importante, observe que essa decisão torna mais difícil o trabalho da acusação
para obter a condenação do acusado, certo?! A chance de haver uma nulidade e a
prova ser desentranhada dos autos é grande. Por isso, se você estuda para o MP,
em provas discursivas e orais, demonstre conhecimento acerca da decisão do STJ
e, em seguida, faça a crítica no sentido que tal entendimento coloca em xeque a
presunção de veracidade dos atos administrativos realizados pelo Estado.
Espero que tenham gostado da dica! Bom estudo!
Rafael Bravo
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Já tinha estudado o recente julgado, mas a explanação do professor me fez vislumbrar melhor como responder questões acerca do tema. Obrigada!
ResponderExcluirHá uma distinção a ser feita. A entrada diante de indícios de que há a prática de ilícitos na residência, comprovados previamente por campana, investigações, obtenção de informações ou imagens que fundamentem as suspeitas, independerá de autorização nos termos desse julgados e será considerada válido o ingresso na residência sem a concordância da parte. O que não pode é o ingresso no domicílio partir de mera denúncia anônima, ou pelo simples fato da pessoa correr para dentro do imóvel após perceber a presença da polícia etc. Como nos casos já avaliados pelo STJ... Em síntese, o julgado é aplicável aos casos em que o ingresso se deu não em razão de fundadas suspeitas (justificadas a posteriori) mas em razão do suposto consentimento do agente.
ResponderExcluirO ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou parte de decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que impôs aos órgãos de segurança pública de todo o país a obrigação de registrar, em áudio e vídeo, o ingresso no domicílio de suspeito, como forma de comprovar o consentimento do morador. A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário (RE) 1342077, interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP).
ResponderExcluirSegundo o ministro, ao estabelecer requisitos não previstos na Constituição Federal sobre a inviolabilidade domiciliar (artigo 5º, inciso XI) e impor a obrigação a todos os órgãos de segurança pública do país, de modo a alcançar todos os cidadãos indistintamente, a Sexta Turma do STJ extrapolou sua competência jurisdicional. Ele explica que a natureza do habeas corpus não permite a sua utilização de forma abrangente e totalmente genérica.
Ainda de acordo com o relator, as decisões em HC não podem alcançar indiscriminadamente todos os processos envolvendo a necessidade de busca domiciliar em caso de flagrante delito, ainda mais com a determinação de implantação obrigatória de medidas não previstas em lei relativas à organização administrativa e orçamentárias dos órgãos de segurança pública das unidades federativas.