Oi amigos, tudo bem? Vamos para um temão de prova hoje!
A Constituição da República, ao mesmo tempo em que protege o direito de propriedade como garantia fundamental (art. 5º, XXII), também estabelece limites e deveres a seu exercício, vinculando-o à função social (art. 5º, XXIII).
Entre esses limites extremos, figuram as hipóteses de expropriação por ilícitos gravíssimos, como o cultivo de plantas psicotrópicas e a exploração de trabalho em condições análogas às de escravo.
Nessas situações, a Constituição autoriza que a propriedade seja tomada pelo Estado sem qualquer indenização, como forma de sancionar a violação de direitos fundamentais e proteger valores estruturantes da ordem constitucional.
1. Fundamentos constitucionais da expropriação penal-administrativa
O art. 243 da Constituição, com redação dada pela EC 81/2014, estabelece duas hipóteses de expropriação:
-
Cultivo de plantas psicotrópicas (droga ilícita).
-
Exploração de trabalho escravo.
Em ambos os casos:
-
a expropriação é sanção constitucional;
-
não há direito a indenização;
-
as terras serão destinadas a programas de reforma agrária e habitação social;
-
deve ser assegurado o contraditório e a ampla defesa (aplicação implícita dos arts. 5º, LIV e LV).
A expropriação prevista no art. 243 tem natureza sui generis, situada entre o confisco penal e a desapropriação administrativa sancionatória, exigindo a verificação de pressupostos específicos tanto de ordem fática quanto subjetiva.
2. Exigência de dolo ou culpa?
2.1. Jurisprudência e doutrina sobre exigência de culpa do proprietário
A Constituição não exige dolo. A responsabilidade do proprietário, para fins de expropriação, é objetivada, bastando a constatação de culpa, no sentido de negligência, imprudência ou imperícia, ou mesmo culpa in vigilando ou culpa in eligendo.
O Supremo Tribunal Federal tem se inclinado a reconhecer que:
-
Não se exige intenção (dolo) do proprietário,
-
mas é indispensável demonstrar que não se tratava de proprietário totalmente alheio ao ilícito, sob pena de responsabilização desproporcional e violação ao devido processo legal substantivo.
Assim, não há confisco automático. A Administração ou o Judiciário devem demonstrar que o proprietário sabia ou deveria saber da prática ilícita e não adotou medidas para evitá-la. A propriedade absolutamente de boa-fé é insuscetível de expropriação.
O STF definiu o seguinte: “A expropriação prevista no artigo 243, da Constituição Federal, pode ser afastada desde que o proprietário comprove que não incorreu em culpa, ainda que in vigilando* ou in elegendo**”.
2.2. Trabalho escravo
Com a EC 81/2014, a expropriação passou a abranger qualquer imóvel, urbano ou rural, em que haja exploração de trabalho análogo ao escravo.
A doutrina majoritária e atos normativos federais (como a Portaria Interministerial nº 4/2016 e o art. 149 do CP) convergem para que a expropriação dependa de demonstração de culpa do proprietário, ainda que na modalidade culpa in vigilando. Isso porque muitos proprietários alegam desconhecimento da conduta de prepostos ou contratados. O Estado deve demonstrar que o proprietário tinha meios de fiscalização e não os exerceu adequadamente.
2.3. Drogas
Para imóveis rurais com plantio de psicotrópicos, a orientação é semelhante:
-
Não se exige dolo específico do proprietário,
-
mas é necessária a demonstração de que ele, ao menos culposamente, permitiu ou tolerou a atividade criminosa.
Se terceiros invadem a propriedade para cultivar drogas sem qualquer participação, tolerância ou negligência do titular, a expropriação é indevida.
3. Exige habitualidade?
3.1. Interpretação do texto constitucional
A Constituição não exige habitualidade. Basta um ato de cultivo de plantas psicotrópicas ou uma situação de trabalho escravo para autorizar a expropriação.
3.2. Finalidade da norma
A norma tem caráter:
-
preventivo (desestimular práticas gravíssimas);
-
sancionatório;
-
protetivo de direitos fundamentais (dignidade humana, saúde pública, liberdade).
Exigir habitualidade esvaziaria a eficácia da previsão constitucional, permitindo que o ilícito fosse sancionado apenas quando reiterado, o que contraria sua natureza protetiva.
3.3. Jurisprudência
Decisões do STJ e de Tribunais Regionais Federais têm entendido que:
-
a habitualidade não é requisito,
-
mas a constatação deve ser materialmente relevante, ou seja, não pode ser meramente simbólica ou de baixa significância.
4. Requisitos legais e procedimentais para a perda da propriedade
4.1. Requisitos materiais (objetivos e subjetivos)
a) Existência de ilícito constitucionalmente previsto
-
cultivo, exploração, extração ou colheita de plantas psicotrópicas sem autorização;
-
submissão de trabalhadores a condições análogas às de escravo (CP, art. 149).
b) Nexo entre o imóvel e a prática ilícita
O imóvel deve ser instrumento, local ou meio da prática.
c) Culpa do proprietário
-
culpa direta;
-
culpa por omissão;
-
culpa in vigilando ou in eligendo.
d) Ausência de boa-fé objetiva
O proprietário deve agir conforme deveres de cuidado e fiscalização da exploração econômica do imóvel.
4.2. Destinação do imóvel
-
Reforma agrária (zonas rurais)
-
Programas de habitação popular (zonas urbanas)Leva-se em conta o interesse social e a função reparatória da norma.
5. Compatibilidade com o princípio da proporcionalidade
A expropriação é severa, mas justificada pela necessidade de combate a ilícitos que atingem:
-
saúde pública;
-
dignidade da pessoa humana;
-
ordem econômica;
-
direitos humanos.
A exigência de culpa do proprietário funciona como salvaguarda proporcional para evitar confisco arbitrário.
Conclusão
A expropriação prevista no art. 243 da Constituição Federal constitui instrumento extraordinário de proteção da dignidade humana e da saúde pública. Para sua incidência, não se exige dolo, bastando culpa do proprietário, entendida de forma ampla, desde que comprovada e incompatível com a boa-fé objetiva. Tampouco se requer habitualidade, pois a mera constatação do ilícito já configura violação grave da função social da propriedade. A perda do imóvel, contudo, depende de processo regular, com demonstração clara do nexo entre o bem e a prática ilícita, bem como do elemento subjetivo mínimo do titular.
Eduardo, em 6/12/25
No instagram @eduardorgoncalves


0 comentários:
Postar um comentário
Sua interação é fundamental para nós!