Oi meus amigos tudo bem? Tema de hoje é o seguinte: Mandados de Criminalização, o mínimo a saber.
Os Mandados de Criminalização são diretrizes ou ordens implícitas (ou explícitas, dependendo da interpretação) contidas na Constituição Federal de um país, que impõem ao legislador ordinário (o Congresso Nacional, no caso do Brasil) o dever de criar leis que tipifiquem (tornem crime) determinadas condutas.
Em outras palavras, a Constituição não apenas estabelece direitos e limitações, mas também, em certos casos, exige a intervenção penal para proteger bens jurídicos fundamentais, combatendo condutas que a própria Carta Magna considera inaceitáveis ou perigosas para a sociedade e o Estado Democrático de Direito.
Isso tudo se relaciona com a proibição de proteção deficiente de bens jurídicos caros ao constituinte!
Fundamento e Natureza Jurídica
A discussão sobre Mandados de Criminalização reside na tensão entre o Princípio da Reserva Legal (nullum crimen, nulla poena sine lege - não há crime, nem pena sem lei anterior que os defina) e o Dever de Proteção imposto ao Estado.
Dever de Proteção: O Estado tem o dever de proteger bens jurídicos essenciais (vida, saúde, honra, ordem democrática, etc.). Em casos extremos, a ferramenta mais eficaz de proteção é o Direito Penal, que é a ultima ratio.
Interpretação Constitucional: A Suprema Corte (STF) é a principal responsável por interpretar se um dispositivo constitucional contém, de fato, uma ordem para criminalizar, ou se é apenas uma diretriz para o legislador.
Principais Mandados de Criminalização na Constituição Federal do Brasil (1988)
A doutrina e a jurisprudência brasileira identificam diversos mandados de criminalização na CF/88. Eles se dividem, principalmente, em duas categorias:
1. Mandados Expressos (Obrigatoriedade Clara)
São aqueles em que a Constituição utiliza o verbo "punirá" ou "constituem crimes" para indicar claramente a necessidade de criação de leis penais específicas.
| Mandamento Constitucional | Dispositivo CF/88 | Objeto da Criminalização |
| Racismo | Art. 5º, XLII | A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. |
| Tortura, Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Drogas Afins, Terrorismo e Crimes Hediondos (TTT-H) | Art. 5º, XLIII | A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. |
| Ação de grupos armados | Art. 5º, XLIV | Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. |
2. Mandados Implícitos ou Decorrentes (Obrigatoriedade por Interpretação)
São aqueles que decorrem da necessidade de proteger direitos fundamentais ou a ordem constitucional, embora o texto não use a palavra "crime" de forma explícita, mas sim imponha um dever de punir ou coibir certas condutas.
| Mandamento Constitucional | Dispositivo CF/88 | Objeto da Criminalização (Exemplos) |
| Proteção ao Meio Ambiente | Art. 225, § 3º | As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. |
| Liberdade de Expressão (vedação do anonimato) | Art. 5º, IV | É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. (Implica o dever de punir a calúnia, injúria e difamação praticadas anonimamente ou a incitação ao ódio). |
| Combate à Corrupção | Art. 37, § 4º | Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. |
Consequências da Omissão Legislativa
Quando a Constituição estabelece um Mandado de Criminalização (especialmente os expressos) e o Poder Legislativo se omite em criar a lei penal exigida, ocorre a chamada Inconstitucionalidade por Omissão ou Síndrome da Inefetividade das Normas Constitucionais.
Para combater essa omissão, os cidadãos ou órgãos competentes podem ajuizar:
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO): Visa a declaração de que o Poder Legislativo não cumpriu seu dever constitucional.
Mandado de Injunção (MI): Garante que o indivíduo possa exercer direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o seu exercício.
Exemplo: A Lei de Combate ao Terrorismo (Lei nº 13.260/2016) foi editada, em parte, para dar efetividade ao Mandado de Criminalização expresso no Art. 5º, XLIII, da CF/88, que trata do terrorismo. A ausência de tipificação por um longo período gerou discussões sobre a omissão inconstitucional.
Pontos de Debate Doutrinário
Os Mandados de Criminalização são um tema de intenso debate no Direito Penal e Constitucional:
Poder/Dever de Criminalizar: A doutrina diverge se a ordem constitucional é apenas uma faculdade (o legislador pode criminalizar) ou um dever (o legislador deve criminalizar), embora a maioria dos dispositivos listados acima seja interpretada como dever.
Limites da Intervenção: Mesmo havendo um mandado, o legislador deve respeitar os princípios penais basilares, como o da Proporcionalidade (a pena deve ser justa e razoável) e o da Intervenção Mínima (o Direito Penal só deve atuar quando estritamente necessário).
O Papel do STF: O Supremo Tribunal Federal, ao julgar ações como o Mandado de Injunção (MI) e a ADO, tem o poder de pressionar o legislador ou até mesmo, excepcionalmente, suprir a omissão legislativa (no caso do MI), dando concretude ao mandado de criminalização. Um exemplo do STF suprimindo a omissão é o caso da criminalização da homofobia como racismo!


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