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PRESCRIÇÃO PARA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS DE TORTURA OCORRIDOS NO PERÍODO DA DITADURA MILITAR
Olá meus amigos, buenas!
Eduardo quem escreve com um tema super recorrente em provas.
Imaginem a seguinte situação: Em 1970 José Osório Stalalalves foi torturado e morto pelo regime militar. A pergunta é: há responsabilidade civil do Estado ainda na data de hoje? Os familiares do falecido podem pedir indenização ao estado nos dias hodiernos?
A primeira coisa que os senhores devem saber é que, em regra, a prescrição contra a Fazenda Pública é de 05 anos. Veja-se o art. 1 do DL 20910/1932: Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Lembrem, ainda, o teor da Súmula 383 do STJ: A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo.
Então, como os fatos ocorreram em 1970, aparentemente estaria prescrito o direito de pedir indenização, certo?
Essa é contudo, apenas a regra geral. Hoje vamos aprender uma exceção, que é a imprescritibilidade para atos ocorridos na ditadura militar que atente contra a vida ou dignidade das pessoas.
Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO.
INDENIZAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. REGIME MILITAR. DISSIDENTE
POLÍTICO PRESO NA ÉPOCA DO REGIME MILITAR. TORTURA. DANO MORAL. FATO NOTÓRIO.
NEXO CAUSAL. NÃO INCIDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL - ART. 1º DECRETO
20.910/1932. IMPRESCRITIBILIDADE.
1. A dignidade da pessoa humana, valor
erigido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, experimenta
os mais expressivos atentados quando engendradas a tortura e a morte, máxime
por delito de opinião.
2. Sob esse ângulo, dispõe a Constituição
Federal: "Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade
da pessoa humana;" "Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes;
(...) III - ninguém será submetido a tortura
nem a tratamento desumano ou degradante;" 3. Destarte, o egrégio STF
assentou que: "...o delito de
tortura - por comportar formas múltiplas de execução - caracteriza- se pela
inflição de tormentos e suplícios que exasperam, na dimensão física, moral ou
psíquica em que se projetam os seus efeitos, o sofrimento da vítima por atos de
desnecessária, abusiva e inaceitável crueldade. - A norma inscrita no art. 233
da Lei nº 8.069/90, ao definir o crime de tortura contra a criança e o
adolescente, ajusta-se, com extrema fidelidade, ao princípio constitucional da
tipicidade dos delitos (CF, art. 5º, XXXIX). A TORTURA COMO PRÁTICA INACEITÁVEL
DE OFENSA À DIGNIDADE DA PESSOA. A simples referência normativa à tortura,
constante da descrição típica consubstanciada no art. 233 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, exterioriza um universo conceitual impregnado de
noções com que o senso comum e o sentimento de decência das pessoas identificam
as condutas aviltantes que traduzem, na concreção de sua prática, o gesto
ominoso de ofensa à dignidade da pessoa humana. A tortura constitui a negação
arbitrária dos direitos humanos, pois reflete - enquanto prática ilegítima,
imoral e abusiva - um inaceitável ensaio de atuação estatal tendente a asfixiar
e, até mesmo, a suprimir a dignidade, a autonomia e a liberdade com que o
indivíduo foi dotado, de maneira indisponível, pelo ordenamento positivo."
(HC 70.389/SP, Rel. p. Acórdão Min. Celso de Mello, DJ 10/08/2001) 4. À luz das
cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a
proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República
Federativa, posto seu fundamento.
5. Consectariamente, não há falar em
prescrição da ação que visa implementar um dos pilares da República, máxime
porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir,
correspondente ao direito inalienável à dignidade.
6. Outrossim, a Lei 9.140/95, que criou as
ações correspondentes às violações à dignidade humana, perpetradas em período
de supressão das liberdades públicas, previu a ação condenatória no art. 14,
sem estipular-lhe prazo prescricional, por isso que a lex specialis convive com
a lex generalis, sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil
no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa
humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do
ser humano.
7. Ação ordinária proposta com objetivo de reconhecimento de danos
materiais e morais, em face do Estado, pela prática de atos ilegítimos
decorrentes de perseguições políticas perpetradas por ocasião do golpe militar
de 1964, que culminaram na prisão do pai dos autores, bem como na sua tortura,
cujas consequências alega irreparáveis.
8. A prova inequívoca da perseguição política
à vítima e de imposição, por via oblíqua, de sobrevivência clandestina,
atentando contra a dignidade da pessoa humana.
9. A indenização pretendida tem amparo
constitucional no art. 8º, § 3º, do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias. Precedentes.
10. Adjuntem-se à lei interna, as inúmeras
convenções internacionais firmadas pelo Brasil, a começar pela Declaração
Universal da ONU, e demais convenções específicas sobre a tortura, tais como a
Convenção contra a Tortura adotada pela Assembleia Geral da ONU, a Convenção
Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena, e a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
11. A dignidade humana desprezada, in casu,
decorreu do fato de ter sido o autor torturado revelando flagrante violação a
um dos mais singulares direitos humanos, os quais, segundo os tratadistas, são
inatos, universais, absolutos, inalienáveis e imprescritíveis.
12. A exigibilidade a qualquer tempo dos
consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o
reconhecimento da dignidade humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da
paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior
estabelecendo no art. 1º que "todos os homens nascem livres e iguais em
dignidade e direitos".
13. A Constituição federal funda-se na
premissa de que a dignidade da pessoa humana é inarredável de qualquer sistema
de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados
direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da
jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito
processual.
14. O egrégio STJ, em oportunidades ímpares
de criação jurisprudencial, vaticinou: "RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRISÃO, TORTURA E MORTE DO PAI E MARIDO DAS
RECORRIDAS. REGIME MILITAR.
ALEGADA PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. LEI N.
9.140/95. RECONHECIMENTO OFICIAL DO FALECIMENTO, PELA COMISSÃO ESPECIAL DE
DESAPARECIDOS POLÍTICOS, EM 1996. DIES A QUO PARA A CONTAGEM DO PRAZO
PRESCRICIONAL.
A Lei n. 9.140, de 04.12.95, reabriu o prazo
para investigação, e consequente reconhecimento de mortes decorrentes de
perseguição política no período de 2 de setembro de 1961 a 05 de outubro de
1998, para possibilitar tanto os registros de óbito dessas pessoas como as
indenizações para reparar os danos causados pelo Estado às pessoas perseguidas,
ou ao seu cônjuge, companheiro ou companheira, descendentes, ascendentes ou
colaterais até o quarto grau.
omissis ...em se tratando de lesão à
integridade física, deve-se entender que
esse direito é imprescritível, pois não há confundi-lo com seus efeitos patrimoniais
reflexos e dependentes.
"O dano noticiado, caso seja provado,
atinge o mais consagrado direito da cidadania: o de respeito pelo Estado à vida
e de respeito à dignidade humana. O delito de tortura é hediondo. A
imprescritibilidade deve ser a regra quando se busca indenização por danos
morais consequentes da sua prática" (REsp n. 379.414/PR, Rel. Min. José Delgado, in DJ de 17.02.2003).
Recurso especial não conhecido." (REsp
449.000/PE, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 3/06/2003) 15. Recurso
especial provido para afastar in casu a
aplicação da norma inserta no art. 1.º do Decreto n.º 20.910/32, determinando o
retorno dos autos à instância de origem, para que dê prosseguimento ao feito. (REsp 1165986/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/11/2010, DJe 04/02/2011)
Em outras palavras: "A obrigação de reparar, trazida pela Convenção da ONU contra a tortura não pode ser obstada por disposições do direito interno de um Estado e na orientação, também internacional, de que a obrigação de indenizar é um dever jurídico próprio do Estado que não deve depender da atividade processual das vítimas. Por essas razões, o caso não poderia ter o mesmo tratamento de outras ações contra a Fazenda Pública."
Certo amigos? Vamos a tese: a reparação civil dos danos causados em virtude de atos de exceção praticados durante o regime militar (especialmente tortura e assassinatos) é imprescritível.
#tamojunto
Eduardo, em 22/2/19
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E no caso de responsabilidade civil do (já reconhecidamente declarado) torturador, em ação ajuizada contra a pessoa do agente?
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